Por mais que os fãs de histórias em quadrinhos e afins se esgoelem para destacar as qualidades "viscerais" de "Batman - O Cavaleiro das Trevas", o filme vai muito além de elogios rasgados e vazios, de frases de efeitos e de interpretações intensas como a de Heath Ledger (morto em janeiro) no papel de um perturbado Coringa ou de Aaron Eckhart como o atormentado Harvey Dent - sem contar Chris Bale como o Homem-Morcego. Fala de como nos alimentamos de uma correção política inexistente, de falsos heróis e, especialmente, de heroísmos desnecessários nos dias de hoje.
Divulgação Chris Bale é Bruce Wayne, o alter ego de Batman em "O Cavaleiro das Trevas" |
Christopher Nolan está entre os cineastas de Hollywood que ao menos se esforçam para dar um sentido ao "cinemão mainstream". Já demonstrava sinais dessa consciência em "Batman Begins", o primeiro filme da nova fase da franquia dedicada ao personagem de Bob Kane. Agora, simplesmente confirmou o que se suspeitava: pode realmente haver vida inteligente por trás de adaptações de heróis de histórias em quadrinhos para o cinema. E Nolan certamente é uma delas.
Divulgação Heath Legder como Coringa entrega uma interpretação impressionante |
Ao transportar para a tela grande histórias seminais na "cronologia" de Batman, o cineasta se despiu de todas as obrigações e inseriu o Homem-Morcego num contexto contemporâneo. A demolição da mansão Wayne em "Batman Begins" teve um caráter simbólico para dar sentido à "criação" do Homem-Morcego e fazer referência à queda das Torres Gêmeas. Aqui, o mal primitivo representado pela figura abjeta do Coringa e a ambigüidade representada pelo (literalmente) dividido Harvey Duas-Caras levam Batman e o comissário Gordon - os representantes do lado bom - a uma montanha-russa de emoções.
Divulgação Maggie Gyllenhall e Aaron Eckhart são Rachel e Harvey Dent |
Com a ajuda de um elenco afiado e de primeira, Nolan transforma essa pantomima e as falas de efeito - sempre presentes nos filmes de super-heróis - em um espetáculo visual. Não apenas pela ambientação, a caracterização dos personagens ou os efeitos especiais, mas por saber manejar a câmera de forma a dar sentido dramático a cada um dos personagens e de seu peso na história. Um exemplo: uma seqüência em que Batman segura o Coringa de cabeça para baixo em uma espécie de andaime e ambos discutem. É algo muito sofisticado e nada gratuito.
Se não tem sentido festejar cegamente as qualidades de um filme simplesmente porque seu personagem é herói popular dos quadrinhos, também não tem sentido descartá-lo completamente justamente por gozar dessa popularidade toda, especialmente entre os mais jovens. Que é um dos exercícios preferidos da "intelligentsia": julgar sem ver ou ao menos tentar entender o que significa esse movimento todo.
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